Das
lembranças que eu guardo da infância, a mais gostosa é o banho de rio. Do
Piancó ao rio do Peixe, todos eram diversão gratuita e garantida.
A título de esclarecimento, o banho de rio era
um tabu, pois era proibido pela nossa mãe. O que o tornava mais atraente.
Lá em Pombal do Rio do Peixe, por exemplo. Logo
depois do café, já sob recomendação da mãe, seguíamos para a praça do
Centenário para encontrar os outros meninos.
Além do banho, diversão garantida e excitante era brechar as lavadeiras trabalhando na margem do rio
Éramos
muitos, e bons, seguindo para os folguedos aquáticos: eu, Silvino e Humberto
nos juntávamos a Thales e John Newton; Elrizinho e Moreirinha; Pedrinho,
Chiquinho e Joãozinho; Fernando e Raul; Herminio Neto; Paulo Abrantes; e
Geraldo Aquiles.
Primeira parada, autorizada, era no Altinho de
Dª. Neca. Servía para disfarçar, pois era do lado oposto ao rio. Lá na fazenda
nós brincávamos a manhã inteira. Depois seguíamos pela linha do trem,
passávamos ao lado do Grande Hotel, até chegarmos ao rio. É bom deixar claro
que não era um simples “banho de rio”: era uma verdadeira aventura infantil,
pois lá havia mais atrações do que simplesmente o mergulhar.
Banho era composto pelos
riscos que corríamos, e o entorno: o que havia de interessante às suas margens.
Durante o banho Geraldo Aquiles, doido de pedra, se exibia, mergulhando no meio
dos anzóis e dando “piaus”. Herminio Neto e Elrizinho gostavam mesmo era de dar
“caldo” nos meninos menores, mergulhando nossas cabeças embaixo d’água.
Cabras-de-peia!
Certa vez, Humberto e eu quase nos afogamos num
lado mais fundo do rio: fomos salvos por Paulo Abrantes, menino maior e mais
experiente, a quem seremos gratos enquanto vida tivermos.
Além do banho, diversão garantida e excitante
era brechar as lavadeiras trabalhando na margem do rio, acocoradas pé-leste,
pé-oeste... Um deleite, para os olhos do menino-quase-rapaz!
Chamavam atenção as frondosas oiticicas, sempre
presentes nas margens do rio e de riachos secos, afluentes do grande rio. Era
muito gostoso brincar à sua sombra.
E nós todos aprendíamos o poder medicinal da
oiticica sobre a prisão-de-ventre. Não o caroço nem a folhas, muito menos as
raízes: A SOMBRA da oiticica, isto sim é que fazia bem para tratar de prisão de
ventre! Que prazer!Depois de uma manhã de
brincadeiras, que culminou com um mergulho no rio do Peixe, finalmente chegava
a hora da volta pra casa, e enfrentar Mamãe.
A volta não podia ser diretamente, tinha que ser
longa e arrodeada, para dar tempo de o cabelo secar e disfarçar melhor o
pecado.
Passávamos pelo rói-couro, onde aproveitávamos
para dar uma rápida espiada: não víamos nada, só a imaginação é que funcionava!
Depois subíamos até a da fábrica Brasil Oiticica, de onde descíamos até chegar
em casa, famintos.
Quando chegávamos em casa, a primeira reação de
Mamãe, ao nos ver, era: você tomou banho de rio, seu cabrito! E tome couro:
Lap! Lap!
A volta tinha que ser longa e arrodeada, para dar tempo de o cabelo secar e disfarçar melhor o pecado
Até hoje não sei como é que ela
adivinhava. Acho mesmo é que mamãe nos batia por atacado, para acertar no
varejo.
Depois do castigo, à tarde tinha novas
brincadeiras, jogar futebol, ver o pobre do pirarucu aprisionado no tanque
atrás da matriz. Depois tomávamos banho DE CHUVEIRO! E nos vestíamos o melhor
possível para o quem-me-quer na praça, já de noite, após a missa na matriz.
Nessas horas nós deixávamos de ser meninos, e
nos dedicávamos a outra atividade mais gostosa ainda: o flerte!
José Mário Espínola é médico e escritor