Certa feita, chegou Tota Freire à Santana dos Garrotes, a mascatear com seu caminhão. Era festa da padroeira do lugar, Senhora Santana, e um bom momento para ele fazer excelentes negócios e rever amigos e parentes, que os tinha muitos, alí.
Além das festividades religiosas, havia as profanas, como sói acontecer em todos os eventos como esse, no interior. Estava programado um baile para a noite dêsse dia, aproveitando Tota a oportunidade para se divertir um pouco, pois não só do trabalho vive o homem.
Às oito horas da noite, já se encontrava Tota no salão, tomando a sua cervejinha em companhia de amigos, deleitando-os com a sua incomparável e deliciosa verve. O baile iniciou-se animado e os pares começaram logo a dançar. Tota, então, como todo pé de valsa formado nos forrós sertanejos, sentiu desejo de, também, balançar o esqueleto. Ficou a matutar com que dama dançaria, eis que não lhe ficaria bem fazê-lo com adolescentes ou outra jovem qualquer, pois a sua condição de “homem casado” talvez as inibisse, aceitando elas a sua parceria, quem sabe, apenas por uma questão de gentileza e atenção à amizade que o vinculava aos seus pais.
E enquanto bebia, conversava e procurava uma parceira que se ajustasse à sua situação, avistou duas vitalinas rodopiando pelo salão, como se fossem um par de bailarinos, o que era muito comum nos sertões daqueles tempos, posto que alí ainda não chegara a “dança sôlta” de hoje, que sepultou toda a arte coreográfica dos bailados de outrora, infelizmente.
Concluída a “parte“, as balzaqueanas retornaram às suas cadeiras, entregando-se à animada palestra, mui certamente tecendo os seus comentários e as suas críticas ferinas, calcados na inveja característica de quem já atingiu, inexoravelmente, o caritó.
Reiniciada a dança, Tota pediu licença aos seus companheiros e se dirigiu a uma das vitalinas, solicitando lhe desse a honraria de ser seu par naquela contra-dança. A moça velha, então, saiu-se com esta:
— Seu Tota, o sinhô me adiscurpe, mais eu num danço cum home…
Tota imediatamente devolveu-lhe:
— Tá, dona, a sinhora impatou cumigo, purquê eu também num danço.
E foi em busca de um brotinho para sambar.
Felizardo Leite
Adhemar Leite.