“É legal saber que o autor dessa obra se estivesse vivo estaria hoje feliz em saber que a riqueza maior de um ser humano e deixar o legado de sua memória para um povo...
Mas, graças a Genialidade de seu filho Adhemar Leite, que terminou copilando o livro do seu pai com muita capacidade em fazer esse trabalho.”
Segue abaixo O livbro do Dr. Felizardo que não foi lançado.
Tavinho Sá Leitão
Após
mais de 14 anos de sua morte, ocorrida em 27 de fevereiro de 2.001, seis dias
antes dele completar 71 anos, estou publicando na “internet” o livro, incompleto, escrito pelo D.r
Felizardo Toscano Leite Ferreira Néto sôbre algumas pessoas que avultaram na
cidade de Piancó e nela fizeram e deixaram história. O tema do livro, porém,
não é a história de fatos cívicos, econômicos ou políticos. E sim a história de
fatos cotidianos que emolduram os poucos privilegiados cuja personalidade o D.r
Felizardo conseguiu registrar antes de morrer. Existiram outras personalidades
que também se destacaram na história de Piancó, mas infelizmente os fatos que
protagonizaram ou não mais poderão ser conhecidos ou terão que ser conhecidos
pelas mãos de outros. Provavelmente com menos romantismo.
Com essa publicação, resgato uma dívida que tinha com D.r Felizardo. Herdeiro
dos originais, nunca consegui dedicar tempo para uma edição em papel. Os
motivos não vem ao caso. Porém, o amor à cidade de Piancó que D.r Felizardo
possuía não poderia ser deixado somente na memória das pessoas dele próximas e
dos mais velhos que o conheceram em vida. Todos ora também se extingüindo, no
decurso natural do tempo que tudo destrói e apaga.
Os escritos de D.r Felizardo a respeito de algumas pessoas que viveram ou
passaram por Piancó são, antes de tudo, memórias românticas de alguém que amou
a cidade, suas ruas, casas, e, principalmente, as pessoas que com ele
conviveram e construíram o passado do qual Piancó tanto se orgulha. Mas que
hoje, pela falta de visão dos atuais homens públicos que labutam na política,
na economia, na sociedade e na educação, está sendo esquecido pelas novas
gerações.
Eis, pois, uma das contribuições dele, D.r Felizardo, para que Piancó continue
a brilhar. Os capítulos, os coloquei em ordem alfabética, já que D.r Felizardo
nunca os ordenou. O título, que o livro também não possui, tive que o dar. Sem
nenhuma originalidade, claro, pois é plagiado descaradamente do livro de Celso
Mariz. Porém, perfeito para a finalidade que o D.r Felizardo quis dar ao livro.
Pena que não o pôde ser ainda em vida.
PIANCÓ
– FIGURAS E FATOS
por Felizardo Toscano Leite Ferreira Néto (* 5 de março de 1.930 + 27 de
fevereiro de 2.001)
Prefácio do autor
O
objetivo deste opúsculo é contribuir, despretensiosamente, com histórias e
fatos pitorescos, que enriqueceram a vida de Piancó e da região, e que tendem a
cair no anonimato, deixando esquecidas pessoas que deram brilho e fulgor ao seu
folclore e à sua vida social. Também o político nêle figurará, sem no entanto,
ser o escopo principal.
Por outro lado, sem se arvorar de inquisidor, procura resgatar o mérito de
personalidades que contribuíram, decisivamente, para projetar a sua importância
no contexto da história paraibana (e até da nacional), relegadas a um
ostracismo criminoso por parte de autoridades que se descuram no trato com os
seus maiores.
De certo tempo para cá, instituiu-se, em Piancó, o mau hábito de homenagear
pessoas obscuras, olvidando-se as que o projetaram política, social, econômica
e culturalmente. A injustiça começa com as duas maiores expressões de sua
história contemporânea: O Dr. Felizardo Leite (*) e o Pe. Aristides Ferreira da
Cruz, lembrados em homenagens muito aquém de seus reais merecimentos. Na
esteira da ingratidão piancoense rolaram nomes como Firmino Leite, Aracy Leite,
Antonieta Moreira Dantas, Manoel Carlos Pereira da Cruz e outros de menor
brilho, para nos atermos apenas aos já desaparecidos.
Relegados, também, ao arquivo da amnésia histórica, avultam outras figuras que,
vindas de plagas distantes, emprestaram o seu trabalho e a sua inteligência ao
progresso da terra, conseguido com o suor e o sacrifício da sua solidariedade.
Mas, a mais expressiva e duradoura homenagem que lhes poderá ser cultuada, é a
esculpida nos linotipos do depoimento impresso em tintas.
E isso será feito.
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Também sepultados no olvido foram Dr. F. R., Dr. A. P., M.B. e outros mais que se incorporaram ao espírito da terra e por ela o melhor do seu esforço e da sua inteligência, nos mais variados aspectos de sua vida comunitária.
(*) Nota minha: O autor se refere a Felizardo Toscano Leite Ferreira, seu avô, cuja biografia resumida será objeto de publicação posterior neste “blog”.
Capítulo I – Antônio Freire
Existiram, em Piancó, dois
irmãos, Antônio (Tota) e Pedro Freire, que, entre outras notáveis virtudes,
foram dotados de inteligência ímpar, apesar de semianalfabetos. Tota, mesmo,
mal assinava o nome. Mas, talvez por isso mesmo, a Natureza compensou-os com
talentos de causar inveja ao mais inteligente dos homens. Tota, a meu ver mais
privilegiado que seu irmão, deixou rico filão de suas tiradas inesquecíveis.
Era proprietário de caminhão e comerciante, trabalhando durante muito tempo no
Maranhão, de onde trazia arroz e madeira para vender na Paraíba, daqui levando
produtos regionais para abastecer o comércio daquele Estado.
Logo que apareceram os primeiros caminhões de “cabine de aço“, onde só cabiam o “chauffeur” e uma
outra pessoa, trocou o seu “Chevrolet”
de cabine de madeira por um “International”
último modêlo.
Certo dia, estando ele em Patos, de passagem para Campina Grande, aonde ia
levar uma carga de algodão em pluma, aproximou-se, de seu veículo, uma senhora,
indagando se havia uma vaga, para si, até a cidade de Campina, que era o pólo
abastecedor de todo o interior da Paraíba e de outros Estados do Nordeste. Tota
respondeu-lhe que, infelizmente, a boléia era pequena e só dava para um
passageiro, no caso ele mesmo, eis que sempre acompanhava o “chauffeur“, pois
tinha necessidade dele próprio fazer os seus negócios. A mulher, que precisava
chegar à Campina com uma certa urgência, contestou que se ele, Tota, não se
importasse ou nenhum transtorno lhe causasse, ela não faria questão de ir
apertada na pequena cabine. Tota disse que, por ele, não havia problema nenhum,
pois o que desejava era servir a ela.
Assim, entrou a mulher na boléia, e logo depois o dono do veículo, e se
acomodaram no pequeno espaço, feitos sardinhas em lata. A estrada era de terra;
não se sonhava nem com asfalto, que era animal inteiramente desconhecido no
desprezado e sofrido Nordeste. Partiu o caminhão e os solavancos foram
incomodando a pobre senhora, arrependida, já, talvez, da sua idéia. E a cada
catabilho que o caminhão dava, pedia a mulher: “Meu senhor, feche as pernas p’ra folgar mais um pouco“.
Depois de cêrca de uma hora de viagem, nas alturas de A. de B., ouvindo aquela
cantilena “meu senhor, feche as pernas
p’ra folgar mais um pouco“, Tota não suportou mais e desferiu à
infeliz mulher:
— Dona, feche a senhora que não tem o que quebrar…
Adhemar Leite