O corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, decidiu nesta segunda-feira (15/04) afastar do cargo a ex-juíza da Lava Jato, Gabriela Hardt (foto). Ela atuou como substituta de Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba. A alegação para o afastamento é de supostas ilegalidades cometidas ao longo da operação.
Durante um interrogatório no processo criminal que viria a condenar Lula da Silva à cadeia, uma fala da juíza ficou famosa. Na ocasião, após sucessivas interrupções do petista, ela disse ao então réu: “Senhor ex-presidente, esse é um interrogatório. Se o senhor começar nesse tom comigo a gente vai ter problema. Então, vamos começar de novo.“
Além dela, os desembargadores Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz e Loraci Flores de Lima e o juiz federal Danilo Pereira Júnior também sofreram a mesma punição. Nesta terça-feira (16/04), o plenário do CNJ vai julgar os processos envolvendo os quatro e pode ratificar as decisões de Salomão.
Salomão, que é ministro do STJ, era o nome preferido de Alexandre de Moraes para as duas vagas abertas no STF durante o atual governo. Contudo, Lula indicou seu ex-advogado criminal, Cristiano Zanin e seu ministro da Justiça, Flávio Dino.
Os crimes supostamente cometidos pela ex-juíza da Lava Jato seriam de peculato-desvio, prevaricação, corrupção privilegiada e corrupção passiva. Salomão aponta irregularidades supostamente cometidas pela juíza à frente do caso. Dentre eles, o direcionamento dos recursos obtidos a partir da homologação de acordos de colaboração e de leniência da Petrobras. O que teria a finalidade de se obter o retorno dos valores em multa pagos pela empresa para fins privados e interesses particulares.
Gabriela teria convencido representantes da Petrobras a firmar com ela, como representante do Estado brasileiro, acordo de assunção de compromissos. Os acordos posteriormente homologados pelo juízo da 13ª Vara teriam o objetivo de permitir o direcionamento de pelo menos R$ 2,5 bilhões a uma fundação de direito privado de interesse pessoal dos próprios procuradores da Lava Jato. Esta fundação ainda estaria por ser criada no momento do acordo.
Salomão afirma que “a natureza da atividade desenvolvida pela reclamada [Gabriela] exige e impõe atuar probo, lídimo, íntegro e transparente, sendo inaceitável que, aparentemente descambando para a ilegalidade, valha-se da relevante função que o Estado lhe confiou para fazer valer suas convicções pessoais”. Ele destacou que a ideia de combate à corrupção da Lava Jato acabou sendo “transformada em uma espécie de ‘cash back’ para interesses privados”.
De acordo com as acusações contra a juíza, ela também atuou em processo autônomo — instaurado de ofício, com absoluto sigilo e sem a participação dos interessados — para suposto controle e destinação de valores oriundos de acordos de colaboração e leniência, inclusive referentes a ações penais sem sentença e, também, sem trânsito em julgado, estabelecendo critérios sem fundamentação legal, eivados de contradição e sem transparência, atingindo montantes superiores a R$ 5 bilhões.
Ainda de acordo com Salomão, “há elementos que atestam a existência de indícios de cometimento de graves infrações disciplinares” pela ex-juíza da Lava Jato. Para ele, seria “inconcebível que a investigada prossiga atuando, quando paira a suspeita de que o seu atuar não seja o lídimo e imparcial”.
Em seguida, afirma que “o afastamento atende à necessidade de resguardo da ordem pública, seriamente comprometida pelo agir irregular dos reclamados. Assim como, atende à necessidade de estancar a conduta aparentemente infracional”, alega o ministro.
“A gravidade dos fatos investigados e a presença de fortes indícios de participação da magistrada apontam para o comprometimento do exercício da função judicante e da credibilidade do Poder Judiciário, o que recomenda o excepcional afastamento das funções do cargo de Desembargador, ainda na fase investigatória, prévia à de eventual oferecimento de denúncia, de modo a preservar-se a segurança e a confiança que a sociedade deve ter no conteúdo das decisões judiciais”, completou Salomão.
A Associação de Juízes Federais (AJUFE), que representa a magistratura federal, manifestou “surpresa” com o pedido de afastamento de Gabriela Hardt, a ex-juíza da Lava Jato que condenou Lula
“O afastamento cautelar de qualquer magistrado reclama motivos de natureza extremamente grave, além de contemporaneidade aos fatos, ainda mais quando determinado de forma monocrática, situações que não se verificam no caso em debate“, aponta a AJUFE.
A Ajufe ainda fez a defesa de Hardt e dos outros juízes: “Os magistrados e magistrada afastados pela decisão monocrática acima referida possuem conduta ilibada e décadas de bons serviços prestados à magistratura nacional, sem qualquer mácula nos seus currículos, sendo absolutamente desarrazoados os seus afastamentos das funções jurisdicionais”.